São como os ratos ou os coelhos. De um momento para o outro, nascem e desenvolvem-se com uma tal rapidez que, se não se arrancarem logo, ei-los frondosos, impondo-se por entre o arvoredo, aparentemente inofensivos. Na primavera, exalam um perfume que conforta o espírito. Apetece protegê-los, por tão agradável aroma que irradia também pelas folhas e pelo tronco. Mas é só isso. Para pouco mais servem, a não ser para invadir as áreas florestais desta segunda maior ilha dos Açores, com cerca de 44 mil e 500 hectares de área.
O Inventário Florestal da Região, relativo a 2007, citado pelo Diário dos Açores, revela que na Ilha do Pico 43% da sua área é ocupada por espaços florestados. Todavia, 11 mil e 700 hectares, foram invadidos pelo incenso e 956 ha pela faia das ilhas, espécies de muito reduzido interesse económico. Esta situação contrasta com a registada em São Miguel e Terceira, onde a criptoméria, a acácia e o eucalipto, espécies com valor comercial, dominam os espaços florestados.
Durante muitas décadas, a ilha do Pico exportou, sobretudo para o Faial, mas também para São Jorge e Terceira, achas em quantidades assinaláveis. Parece que ainda estou a ver carregar nos cais da Madalena e Areia Larga o Adamastor e o Rival. Era no tempo em que não havia gás e os fogões de lenha acendiam-se de manhã e mantinham-se até ao fim da ceia. (Muitas achas acartei e emedei, com os meus irmãos, da rua para a loja, pois os lenhadores descarregavam-nas no caminho junto de casa. E quando faltavam achas na cozinha, todos nós nos esquivávamos, porque além do peso, a lenha fazia verdugos nos nossos débeis bracinhos…)
A serração de madeiras era uma actividade lucrativa para empresários e proprietários dos terrenos do mato, e empregava muita mão de obra. Nas localidades junto à montanha, instalaram-se várias serrações que transformavam as madeiras de acácia, de cedro e de castanheiro. Houve mesmo um emigrante quem trouxe, dos Estados Unidos, sementes de madeiras exóticas que aqui se desenvolveram bem. Ter-se-á perdido esse plantio, por razões que desconheço.
Na década de 50, procedeu a Junta Geral do Distrito da Horta à sementeira de pinheiros nos Mistérios da Ilha, nomeadamente da Silveira e de São João, áreas desertas, onde o musgo seco e acinzentado, dava a cor a uma vasta zona atingida pelas erupções vulcânicas de 1718-1720. (Muito desse musgo era usado na feitura dos tapetes que ornamentavam as ruas pelas procissões religiosas.)
Foi a partir daí que a paisagem “lunar” dos mistérios da Prainha, de Santa Luzia, de São João e da Silveira, mudou de feição e se transformou em espaços aprazíveis muito procurados pelos residentes e paragem obrigatória para os visitantes. De início, o desbaste do pinhal permitia que, pelo Natal, ali se cortasse árvores. Depois, com o crescimento do arvoredo, esse costume foi proibido, por razões óbvias.
Hoje, os mistérios estão povoados também por incensos. A população desta espécie arbórea, originária do sudoeste da Austrália, propaga-se com tal espontaneidade, que invade ¼ da área total da ilha do Pico. As suas características, segundo o Eng. Arlindo Cabral , são o “rápido crescimento e boa rebentação. O incenso é resistente aos ventos e concorre com as culturas protegidas (mais do que sucede, por exemplo com a faia) e a sua sombra é prejudicial às culturas. Depois de cortadas as plantas, o seu raizame é hospedeiro de bolores que facilmente passam às fruteiras e culturas, o que obriga a cuidados especiais...”
Cabral, Arlindo in “Boletim da Comissão Reguladora de Cereais do Arquipélago dos Açores”, nº 17, pag. 80,1953.
Face a este diagnóstico nada abonatório, urge que, rapidamente, as entidades responsáveis tomem medidas adequadas e urgentes para parar a rápida expansão desta invasora. Não se compreende, pois, que o arvoredo de incenso esteja a dominar também parte apreciável das bermas da estrada entre Lajes e São Roque e muitos caminhos municipais e de penetração.
A falta de gente (causa maior de todos os males desta ilha) e o envelhecimento dos residentes, impede os proprietários de trazerem os seus terrenos convenientemente florestados com espécies de valor comercial.
No entanto, para que a actual situação não se agrave e se torne irremediável, compete aos organismos públicos desencadear acções pedagógicas e práticas que obstaculizem os nefastos efeitos do incenso. Como? Educando e mentalizando as populações jovens, em colaboração com as Escolas, cedendo, com facilidade, plantio de espécies economicamente rentáveis como: a criptoméria, a acácia, o cedro, o pinheiro, o castanheiro, o eucalipto, etc.
O Posei prevê apoios para o efeito, mas os Serviços florestais, têm de ser menos zeladores escrupulosos do cumprimento da lei e muito mais “agressivos” na mentalização das pessoas para que tomem atitudes pró-activas na plantação de árvores que beneficiarão a economia familiar e da ilha no seu todo.
Para que o Pico seja uma Ilha onde a biodiversidade não seja infestada por agentes nocivos à qualidade ambiental que nos é reconhecida.
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